domingo, 27 de abril de 2014

                                       O Meu 25 de abril (PARTE II) 


                                      Os Jovens não Estão para Manifes


           No dia 25 de Abril de 2014 fui assistindo esporadicamente às manifes que se iam realizando por Lisboa, com especial enfoque no que se passava no Carmo. (Manifes, tragédias sociais, homicídios colectivos, são um excelente prado onde as Tvs alimentam  os seus programas e noticiários voyeuristas.Vamos em frente) Vi gente exaltada, alegre, voluntariosa que se ia manifestando, empunhando bandeiras, cartazes, clamando palavras/frases de ordem. Foi quando me apercebi que naquela multidão os jovens e adultos jovens (- digamos, com menos de 20 anos)- contavam-se pelos dedos da mão direita. Isto para ser complacente.
         Curioso, quis confirmar objectivamente esta minha observação. Vai daí liguei para amigos com filhos/netos adolescentes, querendo saber aquela hora (meio-dia mais ou menos) onde se encontravam os seus descendentes.
         Este é o cômputo e mais que cômputo, é uma catástrofe:
          5 estavam na cama porque tinham passado a noite anterior numa discoteca
          3 andavam a fazer BTT na serra d'Arga
          3 andavam a surfar na praia da Mariana         
          2 (namorados) tinham ido para a Ribeira do Porto e ainda não tinham regressado
          3 estava no Skype (uma delas a falar com o namorado em Londres)
          2 estavam no facebook
          2 nos videojogos
          2 a ver filmes na televisão
          2 às compras no shopping
          1 (rapaz) na cozinha a preparar um almoço comemorativo para os pais que tinham ido à manif
          1 em casa a tomar conta do filho recem-nascido
          1 a ajudar o pai numa horta biológica
          1 a passear o cão
        Penso que esta amostra é significava. De facto, tenho que concluir que os jovens não estão para manifes pelo quem num alargamento temporal, daqui a vinte anos não haverá ninguém para comemorar o 25 de Abril. Talvez uns octogenários com boa memória e uma saúde de ferro. Céus!Valha-nos isso.



sábado, 26 de abril de 2014

                                                 O meu 25 de Abril (Parte 1)

O meu 25 de Abril foi gasto como de costume, nas horas do costume, fazendo as coisinhas do costume. Ainda vi na TVI uma pivot encartada de burra tropeçar no que estava a dizer e falar da Grândola Vila Moranga (!(, que logo emendou, graças ao Senhor.) Também vi muitas comemorações com um certo cheiro a bafio e desafio, demasiado saudosistas como se falássemos daquele bacano que há-se chegar numa manhã de nevoeiro para nos salvar. Admiro esta gente que vai para as manifes, de cravo, raiva e desencanto na mão. Eu não vou porque não posso e também porque, tanto quanto me lembro, nunca fui a uma única manif. São precisas? São. Fazem muito jeito às TVs que que lhes alimentam as reportagens? Fazem. Têm um cero sabor a raiva domesticada? Têm. Os governantes, sejam eles quem forem, levam-nas a sério? Não.
O meu 25 de Abril fi-lo à minha maneira, a única que melhor sei: escrevendo. Esta é minha lita anti. Anti o que quizerem. Porque se as palavras e as manifes são levadas pelos sete ventos, desejo que aquilo que eu e outros (principalmente os outros) escrevemos , perdurem e deixem um lastro de inquietação. Os bons livros não salvam ninguém, não fazem baixar a taxa de desemprego, nem os altos índices de corrupção, nem  rega-bofe de uma Assembleia da República e um governo que impõem cortes drásticos menos a eles mesmos. No meu queijo ninguém toca!
O meu 25 de Abril foi assim, deixando escrito algumas linhas de inquietação e lucidez. Os meus livros  (pricipalmnete dos outros) não vão salvar a humanidade mas pelo menos  que a sua leitura torne o leitor mais consciente, atento e crítico. E participativo (que não seja apenas em manifes).

sábado, 19 de abril de 2014

                                                          O Portugalzinho

Não queria Portugal assim, pobrezito, entristecito, labedor das suas feriditas, assustadito, soltando para os ar os seus aisitos.
Não queria Portugal assim, alienadozito, embaladito nos progamitas da TVzita, gentinha menorzinha feita famosita pela nossa alienaçãozita, pelo nosso futebolito, pelo Ronaldito madrilenozito, pelo fadito lisbpetita, pelo facebuquito.
Não queria Portugal assim, remordiditnho e ressaibiadinho, atirando para cima dos outros as suas próprias culpazinhas, no temorzito de que vacile o seu egozinho.
Não queria Portugal assim, carregado de saudadezinha e poetazinhos, ignorantezinho, lírico e misticizinho, mais crente na senhora de fatimazinha do que na sua vontadezinha nacional.

Estou no restaurante, chamo o empregado para pagar. Ele aproxima e sussurra:
- É a contazinha?
Confirmo com um sinal de cabeça.
- Quer faturinha?

segunda-feira, 14 de abril de 2014

                                           Senhora dona Esperança de Jesus (Picolina)

os meus dedos esceventes, numa aurora de luzes cristalinas, debruçaram-se sobre o papel desafiadoramente branco, e trataram de redímir e resgatar a senhora dona mais proscrita da cidade. ela, sim, achincalhada, paupérrima, ridicularizada, eliminada das convivências dignas da sociedade que se porta bem. os meus dedos escreventes, pela primeira vez, teceram frases no tear difícil da poesia e procuraram a inspiração numa velha messalina, velha, velha, esquálida. repito: proscrita. tentaram a sua redenção, repito. desejaram o seu resgate, repito. mas logo as vozes da moralidade suspeita atiçaram aquela senhora dona contra mim. percorre a cidade esta pobre senhora dona à minha procura, convencida que estou rico à sua custa e à custa do seu nome.
minha querida senhora dona, como podem fazer de ti um pobre joguete? como podem os ódios ressaibiados, camuflados também,  lambedores das feridas das suas frustrações, fazer de ti um pobre títere?
como se não bastasse teres sido explorada, humilhada, desfesnestrada, avilentada, ainda fazem de ti um fantoche manipulável.
hipocrisia será sempre hipocrisia seja ela dita em que língua for, habite ela que ser humano habitar
                                                    
                                                     Não me faças cumprimentos
                                                     deixa-te de hipocrisias
                                                     o alívio dos maus sentimentos 
                                                     não se faz com cortesias
                                                                                 António Aleixo

domingo, 13 de abril de 2014

                                             Escrever é a liberdade em extensão
Pelos dedos escreventes entro num território de experimentação, experimento o que nunca foi experimentado, faço caminhos que ninguém percorreu, dou vivo sabor às palavras. Os meus dedos escrevem -escrevem-me - e com eles invento as minhas próprias regras de criador. Escrevo um conto, um poema , um capítulo de um romance, uma cena de teatro, e através desses meus dedos escreventes dou a volta ao mundo.
Eu sou eu e os meus dedos escreventes. Por isso, enquanto criador e desafiador, abato regras porque recuso a imitação. Um criador também é para isso que serve: desfazer o que parece estar bem-feito, olhar para o outro lado das palavras, virá-las do avesso. E as pessoas que me lerem, que sofram também dessa transfiguração. O mundo plácido, xaroposo, é para aqueles que nunca se inquietam. Era desses que gostava o caudilho de Santa Comba. É desta matéria de que todos somos feitos. Salazar não foi obra do acaso, tal como a irmandade Passo/Portas. Há uma história nacional por detrás desta gente. Repito: a nossa portugalidade é feita de marasmos, manhas e ciganices.
Por isso, para mim, escrever é a liberdade em extensão.

sábado, 12 de abril de 2014

                                           D. Frei, o meu concentrado escrevente

Assim vivo e respiro numa espécie de redoma escrevente. Trago o arcebispo comigo, como já trouxe a dona Esperança de Jesus(Picolina). E o capitão Melquíades Sobral, um heroi feito de lealdades e coerências (que poucos vianenses conhecem,). E Branca Dias, uma heroina do quotidiano, mulher de multicoragens e multidesafios, a primeira mulher dona de um engenho de açúcar.
Escrevo o que tenho de escrever, escrevo o que se me impõe escrever. Escrever, sim, agilizar a mente escrevente através dos dedos disponíveis para a articulação que se exige: a escrevente.
O importante para mim não é tanto o que sei fazer de melhor mas escrever o que sei e como sei, saindo dos meus próprios limites. Dedos escreventes, façam o que vos impõe: escrever.
E como o Criador-dos-Escritos não deve conhecer limites, ele que escreva o que falta escrever. Aquilo que não está escrito, a omissão do escrito, é o que deve ser  escrito. Escrever o que os outros já escreveram não me parece que seja interessante.
Trago-te comigo, d. frei, não aquele que querem fazer de ti santo, mas o homem das audácias, o que desafiou as águas podres de um catolicismo de fachada, conservador e tramontano. Escrevo o que aos meus dedos escreventes se impõe: re-escrever d. frei, esse homem desassossegado e desassossegador. É com estes meus dedos escreventes que vou roubando dias à morte.